VI COLÓQUIO DO FÓRUM DO CAMPO LACANIANO REDE DIAGONAL BRASIL
Real, clínica e laços sociais
“A estrutura é o real que vem à luz na linguagem” (Jacques Lacan, 1972/2003)
Uma pandemia, um acontecimento de real. Uma situação traumática que afetou a todos os seres falantes, causando tristeza, dor e medo. Para a psicanálise, no entanto, nem todo medo é fobia, nem toda dor é sintoma. Consideramos sintoma o que é fomentado pelo inconsciente. É do real do inconsciente que se trata no dispositivo analítico.
Real, clínica e laços sociais… o que enlaça os termos? A linguagem, a psicanálise, que leva em conta a hipótese significante em sua práxis.
Ao propor uma diferença entre as expressões – acontecimento de real e advento do real – Colette Soler [1] aponta a via da linguagem, uma aproximação do real pelas vias traçadas pela linguagem, possibilitando que interroguemos acerca do real na clínica psicanalítica.
O real, por definição, é o que está fora do simbólico, apenas nos aproximamos dele. Quer dizer, o real ao qual se acede é sempre relativo aos modos de aproximação, o que permite-nos considerar que o dispositivo analítico toca o real.
A fobia do pequeno Hans pode ser tomada como um exemplo, pois ela parte de um acontecimento de real, as primeiras ereções, um dado da vida sexuada, da vida vivente que não deve nada à linguagem. No entanto, ao fazê-lo passar ao significante é advento. A fobia, portanto, ao fabricar um significante fóbico, é um advento. Há que se considerar o aporte significante. Assim sendo, o sintoma é um “advento do real” próprio a cada falante. [2]
O acontecimento de real faz estragos, afeta a vida falante, todavia, não é um advento. A chegada de um novo vírus e suas variantes não é um advento. Certamente, um evento traumático. Mas não é disso que se trata no dispositivo analítico. A psicanálise em sua prática clínica leva em conta o real como o impossível de dizer, o troumatismo.
As vias traçadas pela linguagem permitem aproximações do real. A ciência acede ao real pelas pequenas equações. Esse real não é aquele da psicanálise, é “o real real” [3] , aquele ao qual se acede pela via científica, tal qual a biologia. Um real diferente daquele do inconsciente, o qual é linguagem e também gozo, e se tem acesso por meio da psicanálise.
Há um real fora do simbólico, aquele que se experimenta eventualmente. Há um real próprio ao simbólico, o real da estrutura, [4] aquele que se apresenta como impossível de dizer na clínica, aquele que está em jogo nos laços sociais, entre os dispersos díspares, inclusive. O laço social se funda no real, o real da perda original resultante da operação de linguagem sobre o vivente e condição primária e fundadora de todos os laços de qualquer sociedade. [5]
Eis a nossa proposta de trabalho, fazer reverberar o que funda o laço na clínica, na Escola e na civilização.
Marcia de Assis
p/ Comissão Científica